Os modos verbais nos ensinam que permeamos por três mundos:
1. O mundo das ações concretas, ou seja, o Modo Indicativo;
2. O mundo das possibilidades, isto é, o Modo Subjuntivo;
3. O mundo da ordem, também chamado de Imperativo.
Ainda que todos exerçam a mesma importância em nossas vidas, os verbos do Modo Imperativo estão sendo utilizados sem muito critério. Por ter o poder de impactar, tornaram-se a forma mais recorrente nas redes sociais, palestras, treinamentos, indicações de localização e informações gerais. Ao que tudo indica, estamos nos esquecendo da importância das possibilidades, isto é, usar mais verbos no Modo Subjuntivo.
No mundo das ações concretas, no Modo Indicativo estão os verbos que contam nossa história com ações que fizemos, fazemos e faremos. São nossas mães e pais que, primeiramente, comentam nossas pequenas ações de um tempo em que nossa memória não alcança. Nossos familiares e amigos mantém tudo vivo, lembrando e comentando nossos feitos desde o primeiro choro, primeira arte, ir para a escola entre outros. Com o tempo, já com um histórico de vida, armazenamos nossas memórias e a acionamos sempre nos lembrando dos momentos bons, dos mais importantes, dos tristes e dos mais traumáticos, estes, tão difíceis de apagar. Mas todos eles permanecem em nós e vão nos modelando sempre. E, em cada agora, projetamos o futuro, recordamos o passado e realizamos ações, pois viver é agir. E, vamos realizando nossas atividades diárias, necessárias ou não, obrigatórias ou não, seguindo em frente porque há algo além do agora, como houve no passado.
Este mundo denominado concreto, indicando cada ato, enlaça-se a um mundo de possibilidades com aquelas palavrinhas que sempre lançamos mão: “Quando eu crescer, quero ser médico”, “Quando eu terminar a faculdade, farei uma longa viagem”; “Se eu puder, farei mestrado no próximo ano” e, “Se eu ganhasse na loteria..”. E, neste emaranhado de desejos e necessidades, às vezes, nossas ações se realizam, outras não, já que a vida não é sempre uma certeza. Porém, não há como descartar este mundo de possibilidades e tentar trazê-lo um tempo chamado agora.
Com nossos pais e familiares aprendemos desde muito pequenos o que podemos e o que não podemos fazer: “Não faça mais isso.” E, pela cara da mãe ou do pai, entendemos rápido o que é uma ordem. Mas o Imperativo vai se revelando de formas muito diferente em nossas vidas. Ele se apresenta em momentos que não há uma ordem expressa, que pode ser grave, mas que não tem agressividade como, “Tome cuidado” “Faça o seu melhor”. Há ainda aqueles que são muito próprios dos que desejam sempre o melhor: “Vá com Deus”, “Volte logo”, “Não suma”. Há também aqueles momentos especiais quando nossos pares, amigos e pessoas mais próximas nos acalentam mediante as dores físicas e da alma: “Não chore”; “Tenha calma”; “Conte comigo”. Ou ainda fazem votos de que tudo dê certo: “Confie, tudo se arranjará! Na escola, com a professora e colegas descobrimos que a ordem vem acompanhada de gentileza: “Feche a janela, por favor”; “Espera um pouquinho”; “Estudem para a prova”.
Contudo, ultimamente, o Imperativo ganhou uma proporção descomunal e gera paradoxos. Chega até ser uma forma de chantagem: Coma isto, emagreça rápido, coma aquilo; compre, economize; fale, não fale, grite, não grite, ganhe, perca, viaje, fique em casa e assim por diante. Mas o pior é: “Envie esta mensagem para 100 pessoas senão…” é assustador.
E a loucura se apresenta de todas as formas. Todos nos tornamos donos do que deve ser feito e cumprido. Mas, então, como ficam os diferentes? Como nos relacionaremos com eles? Seremos nós os imperadores a dar-lhes ordens, ainda que eles não estejam fazendo mal a ninguém?
Pensando em não deixar o Imperativo imperar, podemos nos exercitar retomando outros tempos verbais, inclusive os que indicam possibilidade: “Que tal nos vermos neste sábado?” “Quando vamos nos ver e bater um papinho?” Ou ainda, “Cuide-se muito, por favor!” As respostas, com certeza serão menos imperativas e mais colaborativas como: “Podemos sim!” “Logo, logo”; “Obrigado”, “Claro”, “Sim, sim… E muitas ações iniciadas no mundo das possibilidades serão realizadas, sem implicar em obrigações ou ordem, de forma mais prazerosa e verdadeira.
Elza Gabaldi é professora de português para nativos e estrangeiros há 30 anos. Também escreve neste espaço quando possível.