Aqueles Olhos

“Aquellos ojos verdes, serenos como un lago

En cuyas quietas aguas, un día miraré

No saben las tristezas, que en mi alma han dejado

Aquellos ojos verdes, que yo nunca olvidaré”

A música “Aquellos Ojos Verdes” foi cantada e gravada por nada mais, nada menos que Nat King Cole, Ray Conniff, Plácido Domingo entre outros. 

O ditado é antigo: “Os olhos são as janelas da alma”. são eles que revelam verdades indizíveis, tristezas, alegrias e tantas outras expressões que não foram qualificadas, contudo expressadas pelos e nos olhos.  

Os olhos dele, além da vivacidade indescritível, eram azuis e brilhantes. Os cílios longos chamavam a atenção: “que cílios grandes!” Tanto diziam que um dia, valeu-se da tesoura e os cortou. 

A surpresa da mãe foi grande. E ele confirmou: “cortei porque eram muito grandes”. Ocorria  que, por ter um estrabismo no olho esquerdo, ninguém acrescentava o adjetivo bonitos, apenas grandes.

Sofrendo os preconceitos por ser estrábico, enfrentou as dores que o bullying. Assisti sua dor revelada em momentos de ira por não compreender tamanha maldade. 

Tornou-se um jovem que se destacava nas atividades da escola que tardiamente frequentava à noite. Seu trabalho braçal, de tão desgastante e pesado, provocava câimbras tão fortes que o derrubava no chão, na terra onde colhia café. 

Conseguiu uma cirurgia e corrigiu   aquele desvio no olhar. Agora, todos notavam seus olhos grandes, azuis, brilhantes e de cílios longos e tão lindos. 

Namorou, casou, teve dois filhos: um menino e uma menina. Vê-los crescer lhe proporcionaram emoções até então adormecidas. Levar e buscar da escola era uma de suas tarefas. E, entre cadernos, lições de casa e livros, os corpos das duas crianças iam se transformando, quase que acompanhando as séries escolares. 

Um dia comentou: “Não posso ouvir a  música ‘O Caderno’, de Toquinho. Fico com um negócio aqui dentro”, passando a mão no peito.

“Sou eu que vou ser seu amigo,

Vou lhe dar abrigo, se você quiser.

Quando surgirem seus primeiros raios de mulher

A vida se abrirá num feroz carrossel

E você vai rasgar meu papel.”

E assim, no feroz carrossel da vida ele seguiu. Ele, sabendo que a vida pode ser feroz em determinados momentos. Os primeiros raios de mulher podem ser ferozes…

Foi assim que meus olhos viram aqueles olhos azuis e cristalinos como o céu em dia de sol se revelar no carrossel da vida. Um carrossel que rodou, rodou, rodou e o levou montado em seu cavalo aqueles olhos azuis, grandes e brilhantes que nunca mais verei.

Elza Gabaldi é professora de português para nativos e estrangeiros há 30 anos. Também leciona espanhol e escreve neste espaço aos sábados.

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